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quinta-feira, 25 de janeiro de 2007

(DC16) Ter conhecimento e ter boas razões para acreditar

De acordo com Broughton, o método da dúvida não nos obriga a inferir

(1) Suspendo meu juízo sobre se há boas razões para acreditar que P

onde "P" descreve um estado de coisas sensível, de

(2) Suspendo meu juízo sobre se sei que P

mas nos obriga apenas a aceitar (2). (pp. 85-89). Fica então aberta a possibilidade (racional, se o método da dúvida não contém elementos irracionais) de se suspender o juízo sobre se sabemos se P e julgar que há boas razões para acreditarmos que P. Mas se julgar que há boas razões para acreditarmos que P é compatível com acreditar que P (como parece que é), então suspender o juízo sobre se sabemos se P e acreditar que P são compatíveis (a compatibilidade é uma relação transitiva). Portanto, a explicação de Broughton implica que o método da dúvida não nos obriga a abandonar nossas crenças sensíveis. Mas então, se estamos duvidando quando o aplicamos, não estamos duvidando que as coisass sejam tal como as representamos nas nossas crenças sensíveis.

2 comentários:

  1. Tenho dificuldade em aplicar o raciocínio a Descartes porque não consigo ver a filosofia de Descartes representada na expressão "crença sensível" usada acima. O que seria isso, na filosofia cartesiana? Há duas linhas para resposta, uma de John Carriero, outra de Baker & Morris, que podem ser acopladas.

    Acho que John Carriero mostra, com bons fundamentos, que a base da teoria da mente de Descartes, na Primeira Meditação, é a teoria da mente angelical de Tomás de Aquino. Anjos tomásicos têm "crenças sensíveis"? Acho que não, e talvez os anjos de Win Wenders (em filmes como "Tão Longe e Tão Perto") mostrem porque: falta-lhes o corpo.

    Já para a filosofia desenvolvida de Descartes, diferente da filosofia de qualquer Meditação anterior à Sexta considerada até o final, vale o que bem viram Baker & Morris: uma "crença sensível" seria, talvez, uma idéia materialmente falsa, uma idéia intrínseca e irremediavelmente obscura e confusa. Considerando isso, acho que um "estado de coisas sensível" seria, para Descartes, algo como a fome, ou a coceira. Mas mesmo assim a expressão "estado de coisas" não cai muito bem. E certamente não é disso que Broughton está falando. Ou ela está falando da suspensão do juízo em relação à fome e à coceira?

    Enfim, como não vejo como o vocabulário de Broughton traduz o vocabulário de Descartes, e se ela traduz com justiça tal vocabulário, não consigo ver Broughton falando sobre algo que possa ser considerado a filosofia de Descartes.

    Bem, resumindo: como dizer "estado de coisas sensível" no vocabulário de Descartes?

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  2. "...dedicar-me-ei inicialmente aos princípios sobre os quais todas as minhas antigas opiniões estavam apoiadas.
    Tudo que recebi, até presentemente, como o mais verdadeiro e seguro, aprendi-o dos sentidos ou pelos sentidos..." (Primeira Meditação)

    "Crenças sensíveis" e "estado de coisas sensível" serviu apenas para resumir o que é dito nessa passagem e nada mais. Mas se essa terminologia é incômoda por alguma razão, não faz mal, pois ela é mesmo desnecessária para o ponto em questão. Na verdade o melhor seria estender a reflexão para todas as crenças razoáveis que temos antes da aplicação da dúvida metódica, incluindo-se ai as crenças matemáticas.

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