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sábado, 30 de maio de 2009

Preconceitos sobre a filosofia analítica

Heidegger
Toda interpretação se funda na compreensão. O sentido é o que se articula como tal na interpretação e que, na compreensão, já se prelineou como possibilidade de articulação. Na medida em que a proposição (o "juízo") se funda na compreensão, representando uma forma derivada de exercício de interpretação, ela também "possui" um sentido. O sentido, porém, não pode ser definido como algo que ocorre em um juízo ao lado e ao longo do ato de julgar. No presente contexto, a análise temática da proposição visa várias coisas.

Em primeiro lugar, pode-se mostrar na proposição de que maneira a estrutura-"como", contitutiva de toda compreensão e interpretação, é suscetível de modificação. Com isso a compreensão e interpretação aparecem com maior nitidez. Em segundo lugar, a análise da proposição ocupa um lugar privilegiado na problemática de uma ontologia fundamental, uma vez que no início decisivo da antiga ontologia, somente o logos [em grego no original] constituía o fio condutor de acesso ao ente propriamente dito e da determinação do ser dos entes. Por fim, há muito tempo a proposição vale como o lugar próprio e primário da verdade. Esse fenômeno acha-se tão intimamente acoplado ao problema do ser que a presente investigação terá de se deparar necessariamente, em seu curso, com o problema da verdade. Ela já se encontra, embora implicitamente, na dimensão desse problema. A análise da proposição também pretende preparar o advento desta problemática.

Atribuiremos a seguir três significados à palavra proposição. São significados auridos do fenômeno por ela designado, inter-relacionados entre si e que, em sua unidade, delimitam a estrutura completa da proposição. [Martin Heidegger, Ser e Tempo, §33 (Petrópolis: Vozes)]
Por que estou citando essa passagem de um texto de Heidegger? Porque concordo com ele? Não. Porque discordo? Também não. Não tenho certeza de ter entendido tudo o que ele diz nessa passagem. Meu objetivo com essa citação é apresentar um caso paradigmático de contra-exemplo de um preconceito muito difundido na academia: que "filosofia da linguagem" é sinônimo de "filosofia analítica" ou ao menos de "filosofia analítica da linguagem". Ernst Tugendhat, que foi um estudioso de Heidegger, chama um de seus livros Lições Introdutórias à Filosofia Analítica da Linguagem (Ijuí: Unijuí; Tugendhat dedica o livro à memória de Heiddeger). Ele tem o cuidado de colocar o qualificativo "analítica", o que deixa espaço para se pensar em uma filosofia da linguagem não analítica. E acho que o §33 de Ser e Tempo, o trecho inicial do qual eu citei acima, bem como o §34 ("Dasein e discurso. A linguagem"), exemplificam bem essa alternativa, sem entrar no mérito de se é uma boa ou má alternativa. Heidegger está se propondo fazer uma análise da proposição e está dizendo que essa análise ocupa um lugar privilegiado na principal tarefa que ele realiza em Ser e Tempo, e que é a principal tarefa da sua filosofia nessa época. Essa análise não é uma atividade filosófica? E seu tema central não é a linguagem? Se sim, então o que falta para se admitir que se trata de uma filosofia da linguagem?

Outra afirmação importante de Heidegger é que a linguagem era entendida desde os gregos (os que iniciaram a ontologia antiga) como o fio condutor da ontologia. Essa tese atribuída aos gregos (correta ou incorretamente) é muito próxima da afirmação que a filosofia, mesmo a metafísica, deve ser feita por meio da análise da linguagem, uma tese geralmente atribuída aos filósofos analíticos (mas que nem todos os filósofos analíticos aceitam). Portanto, segundo Heidegger, essa tese, que ele combate em Ser e Tempo, não passou a ser defendida apenas com o advento da filosofia analítica no final do séc. XIX. Ou seja, de acordo com Heidegger, de há muito tempo a filosofia atribui importância filosófica crucial à análise da linguagem.

Esse contra-exemplo paradigmático do preconceito referido acima serve para mostrar que, seja qual for a diferença que haja entre filosofia analítica e filosofia continental, se há alguma, essa diferença não é uma diferença de temática. Mas há contra-exemplos análogos de preconceitos análogos: o preconceito que epistemologia, filosofia da ciência, filosofia da lógica e filosofia da matemática são disciplinas apenas da filosofia analítica. Platão e Kant, por exemplo, não tinham uma reflexão espistemológica (que influencia os debates até hoje)? Heidegger não tinha uma reflexão filosófica sobre a natureza da ciência? Hegel não tinha uma filosofia da lógica? Husserl, o professor de Heiddeger, não tinha uma filosofia da matemática?

Mas há um outro preconceito: que filósofos analíticos não estão interessados em história da filosofia. Se isso fosse o caso, eles não estariam interessados na história da filosofia analítica. E se não estivesses interessados nisso, então eles teriam que entrar no debate sobre os problemas que eles querem tratar sem saber como esse debate se desenrolou até sua inserção no mesmo. Mas é difícil ver como isso seria possível. É claro que há muitos filósofos analíticos que fazem história da filosofia, e de alta qualidade. Talvez eles não façam a história da filosofia do modo como os filósofos não-analíticos fazem, ou não sobre os autores preferidos dos filósofos não analíticos. Mas isso já é outra questão. Bertrand Russell, escreveu um livro sobre Leibniz. Bernard Williams escreveu um livro sobre Descartes. A tese de doutorado de Donald Davidson é sobre Platão. Gilbert Ryle escreveu um livro sobre Platão. Peter Strawson escreveu um livro sobre Kant. E hoje em dia a há muitos livros de filósofos analíticos sobre filosofia medieval. Isso são apenas uns poucos contra-exemplos paradigmáticos desse último preconceito. Mas há ainda filósofos analíticos que estudam Hegel, Marx e outros filósofos paradigmaticamente não-analíticos. Entre esses estudiosos de Hegel estão Robert Brandom, John McDowell e Peter Hylton, esse último um grande historiador da filosofia analítica e autor de um artigo que faz parte do Cambridege Companion to Hegel. A abordagem analítica de Marx deu origem ao que se costuma chamar de marxismo analítico.

Eu abordo brevemente um outro preconceito contra a filosofia analítica nesta postagem. Trata-se de pensar que os filósofos analíticos resolvem problema filosóficos como matemáticos, de modo puramente formal, aplicando um algoritmo a um conjunto de dados para obter um certo resultado...

Lutar contra esses preconceitos não é fácil! Às vezes a gente não sabe nem por onde começar...

Desidério Murcho oferece uma análise das causas de tais preconceitos, em Compreender as críticas à filosofia analítica, e mostra a importância de se compreender essas causas para se compreender melhor esses preconceitos e, com isso, poder lidar melhor com eles.

Termino com a sugestão de dois textos importantes para ajudar a compreender a filosofia analítica:

François Recanati, "Pela Filosofia Analítica".
Timothy Williamson, "Depois da viragem linguística?".

23 comentários:

  1. Talvez um começo seja constatar os preconceitos e apresentar isso brevemente numa postagem de blog. Obrigada pelo texto, Alexandre!

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  2. Gisele: Que bom que achaste a postagem útil. Volte sempre.

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  3. Muito bem colocado Alexandre!

    Penso que um dos problemas que alimentam esses preconceitos é a falta de competências filosóficas. Curiosamente, por um lado, temos inúmeros doutores em filosofia que não sabem o que é um argumento, muito menos o que é uma atitude proposicional. Por outro lado, há inúmeros filósofos brasileiros que tentam fazer filosofia da melhor maneira possível. Os conflitos são inevitáveis, principalmente nos congressos. Somos acusados de arrogantes, ingênuos etc. Bom, fazer o que?

    Continuar a pesquisar sério, divulgar a filosofia da melhor maneira possível e cooperarmos para desenvolver a filosofia no Brasil. Pena que muitos dos filósofos brasileiros não se dão a esse trabalho ou se preocupam com o tema apresentado pelo Alexandre.

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  4. Matheus: É verdade. Eu acho que a verdadeira linha que se deve prestar a atenção é aquela que divide competentes de incompetentes, sejam ele analíticos, sejam continentais, se é que essa última distinção é útil.

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  5. Ótimo comentário Alexandre. Creio que a distinção analítica/continental já não seja mais produtiva e realmente esclarecedora. A filosofia em todos os seus campos já está fragmentada demais para que fiquemos alimentando dicotomias de necessidade duvidosa.

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  6. Oi Alexandre

    eu concordo em certa medida com você. Como você percebeu eu evitei usar os termos "analíticos" e "continentais" porque são termos carregados de conotações negativas e trivializam a discussão filosófica: como você é um fil. analítico deve proceder a partir de argumentos, lidar com as objeções, usar bem a lógica, etc. ao passo que eu,um fil. continental, não preciso fazer nada disso porque...sou continetal ora bolas! Evito colocar a distinção nesses termos para evitar esse tipo de relativização da atividade filosófica. Qualquer filósofo que se preze deve avaliar os argumentos, lidar com as objeções, usar bem a lógica etc.

    Com isso não tenho a intenção de dizer que a distinção é irrelevante, pois penso que a diferença de rigor entre filósofos como Derrida e filósofos como Williamsom é enorme, não podemos ignorar esse fato. Além disso, a atividade filosófica brasileira parece dividida entre pessoas que fazem filosofia (geralmente interessados em problemas debatidos por filósofos analíticos) e pessoas que meramente fazem comentário e uma história da filosofia precária (geralmente interessadas em teorias de fil. continentais, embora os analíticos também sejam alvo de mero comentário). Enfim, há muita diferença em jogo para não usarmos esta distinção, mesmo que se trate de uma distinção capaz de provocar guerras dentro dos deptos e outras coisas desagradáveis. Alguns fazem filosofia, outros não. Dos poucos que fazem filosofia, alguns são muito rigorosos outros não.

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  7. Oi Alexandre, citar o Peter Hylton como um "estudioso de Hegel" é meio exagerado, não? Que eu saiba ele só tem um artigo sobre o assunto e ainda assim não é um artigo sobre Hegel, mas sobre a "reação contra o idealismo" (especialmente o idealismo de Bradley e outros britânicos, se não me engano) por parte de Russell e Moore. Não se trata de um estudo sobre Hegel. A esposa do Peter Hylton, Sally Sedwick, esta sim, é estudiosa de Hegel...

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  8. Rogério: Pode ser que eu tenha sido exagerado nesse caso. Mas não seria igualmente exagerado dizer que ele escreveu um artigo sobre Hegel e a filosofia analítica sem ter estudado Hegel? Doutra forma, como ele poderia defender a seguinte tese? "Podemos sumariar a tese [contention] desse ensaio dizendo que enqaunto Russell e Moore estão, em alguma medida, reagindo contra os elementos especificamente hegelelianos do idealismo, são os elementos kantianos os mais importantes para se entender sua reação ao idealismo." (CCH, p. 446) Eu não teria como defender uma tese análoga que envolvesse Wittgenstein e Hegel, se não tivesse estudado Hegel.

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  9. Matheus: Pois é, alguns fazem filosofia e outros não. Mas nem todos os que não fazem deixam de fazer porque são incompetentes no que fazem. E nem todos que não fazem o deixam de fazer porque não fazem filosofia analítica. Esse era meu ponto.

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  10. Oi Alexandre,

    Acho a distinção entre filosofia analítica e continental muito útil. Mas não acho que determinar como analíticos apenas os filósofos contemporâneos seja correto. É analítico todo filósofo que faz análise, que admite que filosofia se faz sobre problemas, mesmo quando o que se faz é história da filosofia. Mesmo quando se faz exegese em filosofia analítica o que se procura destacar é o argumento, como esse argumento visa solucionar um problema, como ele se constitui numa teoria, etc.

    Podem me chamar de preconceituoso...mas prefiro os analíticos sempre. Essa distinção além de útil é necessária. Não é possível que alguém queira atribuir a Derrida e a Russell o mesmo tipo de trabalho e importância!

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  11. Dídimo: É justamente por achar que essa distinção não é útil que não vou argumentar contra o que disseste. Mas acho que entendo o espírito das tuas observações.

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  12. Oi Dídimo

    concordo com você. A diferença de rigor entre fil.continentais e analíticos é muiot grande para nos darmos ao luxo de descartarmos essa distinção. Dizer isso pode ser irritante para algumas pessoas, mas não deixa de ser verdade por isso.

    Eu concordo com o Alexandre que a verdadeira linha que se deve prestar a atenção é aquela que divide competentes de incompetentes. Mas academicamente falando esta é a mesma linha que separa os analíticos dos continentais.

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  13. Concordo contigo gaúcho!!!Pois está diferença de rigor entre filosofia continentais e analíticos .

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  14. Olá, Alexandre

    Muito interessante o seu texto. Mas, a título de informação, devo dizer que a análise de Heidegger acerca da proposição tem a pretensão de mostrar que a análise lógica é dependente de uma análise existencial. Em outras palavras: a estrutura ontológico-existencial determina as condições de possibilidade da análise lógica da proposição. O corolário de tal visão é a tese de que é preciso partir de uma "dimensão" pré-proposicional e pré-predicativa para compreender juízos e proposições e o seu papel no conhecimento e na filosofia. Além disso, Heidegger defende que o sentido não é um conteúdo,nem uma propriedade de proposições. Heidegger defende também que a proposição não é portadora da verdade, mas é a verdade que portadora da proposição!
    o raciocínio é bem complexo, mas podemos resumi-lo da seguinte forma:
    1. Compreender é saber-como, saber fazer, o "poder-realizar as possibilidades que surgem". Possibilidade aqui tem um caráter "prático existencial".
    2. A interpretação é o desenvolvimento de esquemas derivados da compreensão e com base no qual captamos o "como" das entidades, isto é, suas funções e finalidades nas diversas situações que surgem.
    3. A proposição indica ou mostra, comunica e delimita. Tais funções da proposição pressupõe, portanto, diversas capacidades ou habilidades. Tais habilidades são determinadas existencialmente.
    4. A sentença declarativa se vincula a um tipo de ato de fala próprio a uma situação específica e a um tipo de fenômeno específico que Heidegger denomina de Vorhandenheit. Por esta palavra Heidegger entende um tipo-modo de "ser"(padrão de sentido) do qual são inferidos propriedades naturais ou materiais ou abstratas.
    5. Ora,a princípio, não compreendemos, por exemplo, uma mesa como feixe de propriedades naturais ou materiais nem abstratas, mas conforme sua funcionalidade, ou seja, compreendemos a mesa como algo que tem certa finalidade e função quando, por exemplo, comemos durante o almoço ou jantar. Logo, o modo mais originário de apreendermos a mesa está relacionado ao modo prático e funcional e não com a percepção de propriedades naturais e materiais ou abstratas.
    6. O tipo de análise que parte do contexto "prático existencial", uma análise não condicionada à descrição de propriedades e aspectos de algo, é uma análise comprometida com um "logos hermenêutico" e não com "um logos apophântico"(asserção).
    7. O uso hermenêutico da linguagem não faz sentido se meramente conectado a condições de verdade.

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  15. Silvio: grato pelo comentário. Não sei se posso concordar com tudo o que acho que entendi nesse argumento, embora não tenha condições de discordar sobre a interpretação de Heidegger, mesmo tendo estudado Heidegger na graduação com o Róbson Ramos dos Reis (UFSM). Seja como for, não evitaria mal-entendidos e críticas superficiais dizer que ao invés de defender que "o sentido não é um conteúdo,nem uma propriedade de proposições", dizer que há um sentido de "sentido" diferente do sentido em que dizemos que proposições têm sentido e que este é o conteúdo das proposições? Doutra forma, deveríamos concluir as proposições não têm sentido nem conteúdo, o que é, no mínimo estranho.

    Fora isso, fiquei curioso: meu texto é interessante de que modo? "Interessante" é usado muitas vezes para se dizer gentilmente que não se concorda com o que um texto diz. É esse o caso?

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  16. Olá Alexandre

    Em relação à crítica que você fez ao modo como me expressei, o que tenho a dizer é: sim, concordo com você. Foi um descuido do qual não me toquei. De fato, torna-se-ia mais claro o que eu disse se, por exemplo, eu afirmasse que pelo termo "sentido", Heidegger (H) entende algo que não é nem uma propriedade nem um conteúdo de proposições.
    Aliás, defendo esse tipo de crítica em relação grande parte das coisas que já li em H. Por exemplo, H assume a tese de que a proposição não é o portador da verdade. Pelo contrário, é a verdade que é portadora da proposição. Mas, vale ressaltar, que, para H, o termo "verdade" tem um sentido diferente daquele que está em jogo nas teorias da verdade atualmente existentes. A tese de H. não pode ser considerada uma alternativa às teorias tradicionais, pois parte da idéia de que a verdade é um "evento" ou algo próximo a isso. Seria uma espécie de teoria ontológica. Por isso, penso que uma leitura mais "filosófico-analítica" de Heidegger nos permitiria uma melhor compreensão sobre suas concepção filosófica.

    Bem, quando falei que o texto era interessante, eu queria dizer que ele levantava uma discussão que chama a atenção. E isto ocorre porque é uma tentativa de mostrar que as diferenças entre filosofia "analítica" e "continental" não dizem respeito ao tema da linguagem. Trata-se, antes, de uma diferença de estilo de abordagem e de orientações e finalidades mais gerais. Essa é uma discussão rara no Brasil e mais comum nos EUA. Eu concordo com o que você diz. Inclusive, você evitou fazer uma afirmação típica de alguém que se "apaixona" por filosofia analítica, qual seja, a de que o que os "continentais" dizem é "sem sentido".
    Entre os filósofos americanos há interpretações analíticas sobre Heidegger dentre as quais se destacam as de Hubert Dreyfus, Cristina Lafont, William Blattner, Robert Brandom, Daniel Dahlstrom etc.

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  17. Gostei do seu texto, mas devo admitir que a divisão entre analíticos e continentais é importante pra mim. Eu me preocupo com causas sociais e a filosofia analítica praticamente não dá importância pra isso. Tipo, não me interessa saber se Descartes provou ou não se deus existe, mas qual o impacto histórico e social da tentativa de Descartes de provar ou não a existência de Deus. Por que essa segunda questão tem implicações sociais e culturais que ajudam a compreender como o mundo em que vivo se tornou o que é. A partir disso posso propor mudanças. Eu vejo a filosofia como ferramenta pra mudar o mundo, não para desvendar charadas.
    É claro que não estou dizendo que a filosofia analítica é inútil ou inferior. Estou dizendo que, em minha humilde opinião, a filosofia continental é mais interessante por que o meu compromisso é com causas sociais.
    Abraços.

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    1. Tiago, filosofia não é sociologia, embora haja a filosofia social ou filosofia da sociedade e a filosofia da sociologia. A filosofia pode ajudar na crítica à cultura, mas também o podem fazer as ciências empíricas. E não é estranho dizer que a filosofia continental é melhor porque ai ao encontro dos teus interesses? Ela deveria ser melhor porque é uma melhor filosofia, independentemente dos teus interesses, não? Ou teus interesses definem o que a filosofia deve fazer? Filosofia lida com problemas filosóficos e problemas sociais não são problemas filosóficos, embora haja uma relação entre eles e alguns problemas filosóficos.

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    2. Não creio na separação entre problemas sociais e problemas filosóficos. E eu não disse "melhor", disse que acho mais interessante. E é óbvio que é minha opinião. E eu não disse que você tem que segui-la. Todo mundo, inclusive os filósofos famosos, opina sobre o que deve ser a filosofia. Todas são opiniões subjetivas. Não creio em uma opinião objetiva exterior a quem fala. Não tive e não tenho a pretensão de dizer aos outros e à Filosofia o que ela deve ser. Eu disse o que eu creio que ela deve ser sob meu ponto de vista (o mesmo que foi feito nesse post). Isso é o máximo que qualquer pessoa pode fazer.

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    3. Sua crença na não separação entre problemas filosóficos e sociais é subjetiva, certo? Sua crença de que todas as opiniões são subjetivas é subjetiva, certo? Então eu não deveria pensar que você está dizendo alguma coisa objetiva, certo? Mas então, para que você diz o que diz, se não é para convencer ninguém de que o que você diz é uma verdade objetiva? Você está só tentando persuadir as pessoas de que as coisas são assim, como os profissionais do marketing o fazem, nos fazendo crer de que precisamos do que é absolutamente inútil? Ou você está dizendo o que diz como quem recita um poema, a fim de provocar experiências estéticas no teu leitor? Você disse que apenas disse como a filosofia *deve* ser sob o teu ponto de vista. Deve? Para quem? Para ti? Se é só um gosto pessoal, não seria melhor dizer que você está dizendo como você gostaria que ela fosse? Afinal, expressar gostos pessoais nesses termos é o mesmo que dizer que o abacaxi deveria ser menos ácido. Por fim, se toda opinião é subjetiva, você não tenta convencer o garçom de que ele errou na conta que você tem pagar, se ele disser que acredita que 2+2=100, certo? Você só diz que a tua matemática subjetiva é diferente da matemática subjetiva dele e que você não gostou da matemática dele, certo?

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    4. Não entendi qual a necessidade de que se diga algo com a pretensão de ser objetivo. Muito menos por que só se pode dizer algo com essa pretensão. E discordo também que os profissionais do marketing criem necessidades exteriores à sociedade. Mas isso é outra conversa.
      Sobre a matemática, ela é uma convenção social. É convenção social que 2+2 = 4. Portanto, quando vou comprar uma coisa no mercado ou num bar, faço minhas contas e planejo minha vida baseado nessa convenção. Obviamente ficarei frustrado se essas convenções não forem respeitadas. Mas de objetivas, elas não tem nada.
      Agora, sobre opinião pessoal e a acidez do abacaxi: Ora, você parece estar querendo dizer com isso que o acidez do abacaxi é um fato, e dizer que ele deveria ser menos ácido é uma opinião pessoal inútil, uma vez que o gosto não irá mudar a realidade. Isso pode ser usado por qualquer um dos lados de uma disputa. Eu poderia alegar que a separação entre filosofia analítica e filosofia continental é o ácido do abacaxi: um fato. E que sua pretensão em querer diluir essa divisão é mero desejo: você acredita que a filosofia "deve" diluir essa distinção. Mas o ácido (a separação) continuará existindo.
      Você poderia argumentar que a separação entre as duas "filosofias" é mera construção histórica. Eu concordaria sem pestanejar. Mas assim também o é a conta "2+2=4". A questão é que eu não vejo problema em reconhecer a subjetividade das coisas, nem em reconhecer que certos consensos são construções históricas arbitrárias. Não é só por que reconheço a historicidade de uma coisa que quer dizer que ela é necessariamente ruim.
      Ora, nesse sentido que vejo a distinção entre filosofia continental e analítica como uma distinção importante, pois, querendo ou não, são formas muito diferentes de fazer e encarar a filosofia. É claro que há preconceitos e caricaturas de ambos os lados, mas acho a distinção relevante. Também não disse que uma é melhor do que a outra. Disse que a filosofia continental serve muito mais a mim (que sou historiador) do que a filosofia analítica. A disciplina histórica bebe da fonte de Hegel, Marx, kant, Nietzche, Heidegger e, mais recentemente, dos pós-estruturalistas franceses (especialmente Foucault). A forma como esses filósofos concebeu a história está na gênese do campo historiográfico. Isso não quer dizer, entretanto, que a filosofia analítica não contribua com a História. Rawls é um ótimo exemplo.
      Veja que minha defesa da distinção é em termos mais amplos. Da mesma forma como defendo a separação política entre esquerda e direita (não estou querendo dizer com isso que a Filosofia continental é de Esquerda e a Analítica de Direita), pois creio que existe sim uma distinção, mesmo que a separação seja bem menos dicotômica e maniqueísta do que parece a princípio.
      PS: espero não ter ofendido. Odeio ofender as pessoas e sinto-me mal em causar mal estar. Abraços.

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    5. Tudo que dizemos com sinceridade é a expressão de uma crença e uma crença consiste em tomar uma proposição como verdadeira e diferenciamos tomar uma crença como verdadeira e ser verdadeira, pois admitimos a possibilidade de estarmos enganados, ou seja de o mundo ser diferente do modo como pensamos que ele é. O e ser objetivo nada mais é do que isso: a independência da verdade em relação às nossas crenças. Ou seja, quando dizemos algo sinceramente estamos assumindo uma pretensão de objetividade. Do fato que concordamos que 2+2=4 não se segue que isto seja uma convenção, assim como não se segue do fato que concordamos que o sol é uma estrela. Eu não entendi o que disseste sobre a acidez do abacaxi. Sua acidez é mensurável... Não vi ofensa em nada que disseste.

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