Leia a primeira parte desse texto aqui.
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Mas que tipo de coisas seriam esses exemplos? Dado que o que queremos são exemplos paradigmáticos e que esses são aqueles em que não há controvérsia sobre se são casos de filosofia, o tipo de coisas no qual devemos nos concentrar é aquele sobre o qual não há controvérsia que encontramos na filosofia. Ou seja, devemos iniciar nossa busca pelo que é mais trivial acerca da filosofia. Em primeiro lugar, dada a distinção entre fazer e descrever o que se faz, está claro que estamos procurando exemplos de uma certa atividade, a atividade de filosofar. Mas o que há de incontroverso sobre essa atividade por meio do qual possamos começar nossa busca por exemplos? Bem, parece incontroverso que, ao filosofar, os filósofos formulam certas perguntas e procuram respondê-las do melhor modo possível. É o que viemos fazendo até aqui... Essas perguntas são formulações de problemas filosóficos.[2] Agora temos ao menos parte da descrição do tipo de coisas que são os exemplos paradigmáticos que procuramos: problemas filosóficos. Quais poderiam ser os melhores paradigmas de problemas filosóficos?
Geralmente os manuais e introduções à filosofia apresentam como exemplos paradigmáticos de problemas filosóficos perguntas que têm a forma do título dessas postagem: "O que é ____?", que, como vimos, em geral pede uma definição, entendida em termos de condições necessárias e suficientes para algo ser o que é. Isso está ligado à idéia popular que a filosofia tem como objeto de estudo a essência ou natureza das coisas. Mas ela não estuda a essência de qualquer coisa. A filosofia não estuda a essência das cadeiras, por exemplo. Quais são, pois, os exemplos paradigmáticos de problemas filosóficos dessa forma? Geralmente três desses problemas são apresentados como os principais, sendo os demais de algum modo subordinados a eles. Esses três problemas são:
O que é a verdade?
O que é o bem?
O que e o belo?
Podemos aumentar essa lista:
O que é o conhecimento?
O que é a justiça?
O que é a virtude?
O que é arte?
O que é Deus?
O que é mente?
O que é ciência?
E assim por diante. Esses parecem ser exemplos inequívocos, paradigmáticos, de problemas filosóficos. A fim de tentar definir "filosofia", podemos agora examinar o que esses exemplos têm em comum, fora a forma. O que os conceitos de verdade, bem, beleza, conhecimento, justiça, virtude, etc., têm em comum? Por que os conceitos de cadeira e de ameba, por exemplo, não estão nessa lista? Podemos ver o que esses conceitos têm em comum por meio de um experimento mental.[3]
Tentemos imaginar como seria a vida de um povo inteiro que não tivesse o conceito de verdade, por exemplo. Se as pessoas desse povo que não tivessem esse conceito, então elas nunca avaliariam suas afirmações como verdadeiras ou falsas. Elas jamais pensariam que o que dizem é verdadeiro, ou que é falso. Para pensar isso, elas deveriam ter o conceito de verdade. É difícil, para dizer o mínimo, imaginar a vida de um tal povo. Essas pessoas poderiam ter linguagem descritiva? Como elas aprenderiam essa linguagem? Como seria seu ensino? Seja o que for que imaginemos, se conseguirmos imaginar alguma coisa, trata-se de uma forma de vida radicalmente diferente da nossa. E quando digo isso, não estou pensando no contraste entre a forma de vida americana e a forma de vida islâmica, por exemplo. Essas duas formas de vida são muito semelhantes entre si, se comparadas com a forma de vida de um povo que não possuísse o conceito de verdade. Isso mostra que a nossa forma de vida é enformada pela posse desse conceito. Ela é como é porque, entre outras coisas, possuímos o conceito de verdade, porque avaliamos nossas afirmações como verdadeiras ou falsas. Nesse sentido, podemos dizer que o conceito de verdade é um conceito fundamental: é um conceito tal que não podemos imaginar alguém que não o tenha e não seja radicalmente diferente de nós, que o possuímos. O mesmo parece valer, em graus diferentes, para os demais conceito que aparecem na lista de problemas filosóficos acima. Todos eles, em maior ou menor grau, são conceitos fundamentais, no sentido recém explicado. Tentemos imaginar um povo que não possua conceitos estéticos, por exemplo (belo, feio, sublime, grotesco, harmonioso, etc.), e que, portanto, não avalie nada do ponto de vista estético. Todos esses conceitos enformam nosso modo de pensar sobre o mundo. É difícil imaginar como seria pensar qualquer coisa sobre o mundo sem usar esses conceitos.[4]
Mas se o filósofo, ao perguntar o que é a verdade, por exemplo, quer uma definição de "verdade", por que ele não se contenta com a definição de "verdade" que ele encontra em um bom dicionário? O que ele teria a dizer a alguém que lhe oferecesse uma definição de dicionário como resposta? Supostamente, definições de dicionários são corretas, pois são feitas por lingüistas que conhecem muito bem o idioma. Sendo assim, um filósofo não pode rejeitar essas definições sob a alegação de que não são corretas, salvo se tiver alguma boa evidência em contrário. Qual é, pois, a diferença entre um filósofo e um lingüista? Uma tentação muito comum nesse ponto é dizer que as definições dos dicionários não são profundas. Mas geralmente não é nada claro o que se quer dizer com "profunda". Por que as definições do dicionário não são profundas? Quais são as condições para que uma definição seja profunda?
Alguém poderia dizer que, enquanto o lingüista está interessado na linguagem, na palavra "verdade", por exemplo, o filósofo está interessado na própria verdade, na verdade em si mesma. Mas se esse interesse na verdade é um interesse na essência da verdade e se a definição de "verdade" do dicionário apresenta essa essência, então essa não é uma boa explicação da diferença entre um lingüista e um filósofo.
Para saber que diferença é essa, temos que investigar a motivação do filósofo para fazer suas perguntas. Por que o filósofo quer saber, por exemplo, o que a verdade é? Um lingüista quer encontrar definições porque ele é um cientista da linguagem e, como tal, está interessado em quaisquer conhecimentos sobre a linguagem. O filósofo não está interessado em quaisquer conhecimentos sobre a linguagem. Ele está interessado em conhecimentos lingüísticos apenas na medida em que eles são úteis para lidar com um tipo de problema com o qual o lingüista não lida. Por isso, esses problemas com os quais o lingüista não lida são os verdadeiros problemas filosóficos. Tais problemas são os paradoxos formulados com os conceitos que aprecem nas perguntas filosóficas da forma "O que é ____?".
Um paradoxo, de modo geral pode ser pensado como um problema que mostra um certo conflito (real ou aparente) entre nossas intuições. Uma intuição, no sentido em que dizemos que uma afirmação é intuitiva ou contra-intuitiva, é uma afirmação que à maioria de nós parece verdadeira à primeira vista, que a maioria de nós está inclinada a considerar verdadeira à primeira vista. Algumas afirmações intuitivas são banais e particulares. Outras são importantes e gerais. Por exemplo: o princípio de não-contradição, que diz que não é possível que uma afirmação e sua negação ("Chove" e "Não-chove", p.ex.) sejam ambas verdadeiras, é uma intuição muito importante e geral. Um paradoxo é um problema que mostra que, ao menos aparentemente, algumas dessas intuições gerais e importantes estão em conflito.
Um exemplo paradigmático de paradoxo é um dos assim chamados paradoxos de Zenão. A apresentação informal desse paradoxo começa com uma definição de movimento. Um objeto a se move se, e somente se, em instantes de tempo diferentes a estiver em pontos diferentes do espaço. Suponhamos que a se mova do ponto A ao ponto B. Antes de chegar ao ponto B, a deve passar pelo ponto C, que eqüidista de de A e B. Mas antes de passar por C, a terá que passar pelo ponto D, que eqüidista de A e C. E antes de passar por D, a terá de passar pelo ponto E, que eqüidista de A e D. E assim por diante, ao infinito. Isso sugere que entre A e B e, portanto, entre quaisquer dois pontos, há infinitos pontos e, por isso, infinitos intervalos de espaço. Portanto, se a se move de A a B, ou de um ponto qualquer do espaço para outro, então a percorre infinitos intervalos de espaço. Agora, para qualquer ação, se ela é composta de um número infinito de etapas, então trata-se de uma ação impossível, que não pode ser realizada. Se pudesse ser realizada, então isso significa que todas as etapas teriam sido realizadas e, portanto, não seriam infinitas. Mas ir de um ponto a outro do espaço percorrendo infinitos intervalos de espaço é justamente uma ação composta de infinitas etapas. Portanto, se percorrer infinitos intervalos de espaço é necessário para que um objeto qualquer se mova, ou seja, para que vá de um ponto do espaço a outro, então nenhum objeto pode se mover. Logo, o movimento é impossível.
Esse paradoxo é uma inferência, um raciocínio, que parece ter as seguintes três características: ela parece ter premissas verdadeiras, parece ser uma inferência válida e parece ter uma conclusão falsa. Mas isso não é possível. Uma inferência válida é justamente uma que não pode ter premissas verdadeiras e conclusão falsa. Portanto, se essa inferência é realmente válida, então ou ao menos uma de suas premissas, embora pareça muito intuitiva, é falsa, ou a conclusão, embora pareça muito contra-intuitiva, é verdadeira. Se nenhuma dessas opções é o caso, então só pode ser porque essa inferência, embora pareça válida, é inválida. Seja qual for a opção correta, o paradoxo mostra que temos que abandonar alguma intuição. E na investigação sobre qual opção é correta, o filósofo pergunta: O que é o movimento? O que é um ponto? O que é a divisibilidade infinita do espaço? O que é o infinito? Ele faz perguntas dessa forma a fim de lidar com esse paradoxo. Um lingüista não estuda a linguagem com o objetivo de lidar com paradoxos.
Os verdadeiros problemas filosóficos são os paradoxos.[5] Eles formam a parte submersa de um iceberg cuja ponta é formada pelas perguntas da forma "O que é ____?". Eles são o que motivam o filósofo a fazer perguntas dessa forma. É claro que um físico, por exemplo, pode lidar com paradoxos também, em meio às suas investigações e teorizações físicas. Se assim for, ele estará às voltas com problemas filosóficos em meio à sua atividade como físico. Os paradoxos mostram que não temos uma clareza reflexiva sobre o conteúdo de conceitos fundamentais e, portanto, de intuições fundamentais que são expressas por meio desses conceitos. A importância de se lidar com esses problemas é, pois, diretamente proporcional à importância de se ter clareza sobre tais conceitos e intuições.
A filosofia não é determinada apenas pelos problemas com os quais os filósofos lidam. Ela também é determinada pelo modo como eles lidam com esses problemas. E é nesse ponto em que as diferenças mais profundas entre os filósofos se fazem mais sentidas. Alguns defendem, por exemplo, que os problemas filosóficos devem ser resolvidos por meio de uma teoria empírica sobre aquilo que é representado pelos conceitos que aparecem na formulação desses problemas. Outros acreditam que tais problemas devem ser tratados de forma a priori, isto é, independentemente da experiência, seja porque eles devem ser dissolvidos por meio de análise lógica da linguagem, seja porque eles devem ser resolvidos por meio de conhecimento a prori.[6] E muitas outras diferenças metodológicas poderiam ser listadas. Mas, mesmo nesse ponto, devemos ter em mente a distinção entre fazer algo e descrever o que se faz. Se um filósofo diz que a filosofia é empírica, por exemplo, então o que devemos fazer é examinar como o seu filosofar de fato depende de conhecimento empírico. Obviamente, ele dizer que seu filosofar é uma atividade empírica não a torna empírica. Mutatis mutandis, o mesmo vale para o filósofo que diz que seu filosofar é uma atividade a priori.
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[2] Em geral um problema é uma pergunta cuja resposta não sabemos e, por alguma razão, precisamos saber. Por isso, nem toda pergunta cuja resposta não sabemos é um problema. Se não precisamos saber a resposta a uma pergunta, ela não é um problema.
[3] Um experimento mental, ou experimento de pensamento, não é um experimento psicológico, mas sim a descrição de uma situação, real ou fictícia, que serve para enfatizar certos aspectos dos nossos conceitos. Descrita a situação, nos perguntamos como deveríamos usar um determinado conceito nessa situação, ou se poderíamos usá-lo, ou se o teríamos, etc. Conforme a resposta, aspectos desse conceito se tornarão mais evidentes.
[4] Mesmo um naturalista como Quine, que não reconhece uma diferença categorial entre a filosofia e as demais ciências, pois vê ambas como contínuas, quando perguntado sobre a natureza da filosofia, não diz algo muito diferente do que foi dito acima. Leia aqui uma transcrição de um trecho de uma entrevista em que Quine diz o que acredita ser a filosofia.
[5] Russell dizia que os puzzles (literalmente, quebra-cabeça) têm uma função na filosofia da lógica análoga à função que a experiência tem na física: servem para testar as teorias filosóficas, assim como a experiência serve para testar as teorias científicas ("Sobre a Denotação"). Entre os puzzles estão os paradoxos.
[6] Um problema é dissolvido quando algum tipo de erro suposto pela sua formulação é exibido. Esse erro tanto pode ser uma crença falsa quanto uma confusão conceitual. Uma vez descoberto o erro, a pergunta não é respondida, o problema não é resolvido, mas simplesmente abandonado. Ele deixa de ser um problema.
Leituras
Analysis (Stanford Encyclopedia of Philosophy)
Concepts (Stanford Encyclopedia of Philosophy)
Metaphysics (Stanford Encyclopedia of Philosophy)
Convention (Stanford Encyclopedia of Philosophy)
Theories of Meaning (Stanford Encyclopedia of Philosophy)
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Agradeço ao amigo Prof. Eros de Carvalho por comentários à primeira versão desse texto.
Imagem: gravura de M.C. Escher
Em que autores que há aquela discussão sobre as definições, em que é proposto que definições são ou inúteis ou impossíveis? Tenho a impressão de que é nos clássicos... Enfim, ótimo texto introdutório.
ResponderExcluirGreg: Eu realmente não conheço essa discussão. --Obrigado!
ResponderExcluirO texto ajuda bastante a preencher lacunas [e reconstruí-lo] na linha de raciocínio que você seguiu na sala de aula, professor. Muito bom.
ResponderExcluirSérgio: Obrigado. Que bom que o texto foi de ajuda.
ResponderExcluirInteressante texto e belo blog, parabens.
ResponderExcluirA situação paradoxal que refere aos mais diversos problemas filosoficos gerando elementos de contraposição que podem se negar ou não, parece-me muitas vezes entendida através da perspectiva observada como no exemplo que encerra o texto.
Porém o que se apresenta hoje em todos os ramos da ciencia principalmente na area humanas, e me parece caber na filosofia é uma especie de multiparadigmas. Ou seja, nao a superaçao de um paradigma por outro mas a coexistencia dos mesmos, o que entao pode explicar um paradoxo atraves da perspectiva acatada.
Nao me prolongarei por hora, mas deveras complexo responder o que é que seja um termo que nao permite ou nao se deseja um vies valorativo, quando a conceitualizaçao do significado de um signo sendo o mesmo posicional em sua subjetividade depende de um significante exterior.
Alexandre: Obrigado pelo comentário. Não acredito que o paradoxo que eu descrevo se deva ao fato de haver vários paradigmas na filosofia. Ademais, eu apresento uma solução para esse paradoxo.
ResponderExcluirNão sei se entendi a segunda parte do seu comentário.
Não achas que o que disseste poderia ser dito de um modo mais simples e claro?
Ouso fazer uma análise criteriosa do texto:
ResponderExcluirPrimeiramente o autor não segue o método que o próprio propõe para responder à questão "o que é a filosofia?". Enquanto o método proposto é a análise de exemplos paradigmáticos, o que o autor faz é a refutação de quais métodos não são adequados para então passar para o que o autor propõe adequado. Isso é incoerente com a proposta do texto já colocada em seu enunciado, de responder à pergunta “o que é a filosofia?” embora na verdade seja um texto prioritária mente sobre “como responder a pergunta o que é a filosofia?”. Se o texto fosse mais coerente com sua proposta, elucidada no título, teria começado já com a análise dos exemplos paradigmáticos, e não com o questionamento do método.
Em segundo lugar, quando o autor chega à conclusão de que o melhor método para se responder à questão "o que é a filosofia?" é a análise do que há em comum entre os exemplos paradigmáticos, vem logo a questão "quais seriam esses exemplos?", e então o autor recorre aos manuais de filosofia para obtê-los, tornado sua proposta incoerente, pois os mesmos manuais foram escritos pelos filósofos cujas afirmações cabem nos 3 critérios que o autor usa como base de argumento para a proposta de não usar a história da filosofia para investigar o que é filosofia, ou seja, não deve-se basear a resposta na resposta dos filósofos, mesmo os consagrados, pois tais respostas podem ser pessoais, contraditórias e não temos garantia de que sejam verdadeiras. Portanto, tais casos paradigmáticos escolhidos dos manuais de filosofia cabem nesses três critérios de exclusão.
Em terceiro lugar, o autor afirma que o filósofo trabalha com paradoxos, pois são esses paradoxos que levam ao questionamento dos conceitos fundamentais. A pergunta necessária que se segue é: quais paradoxos? Um filósofo lida com os mesmos paradoxos que um físico? Lida com os mesmos paradoxos que um assistente social? Se sim, então a filosofia não é muito diferente das outras áreas do conhecimento, já que todas lidam com a mesma coisa, o que leva a pensar que tanto a filosofia não tem identidade quanto a questão norteadora do texto não tem resposta. Se não, quais são os paradoxos com os quais lida a filosofia? Quais são as condições necessárias e suficientes para que um paradoxo seja do tipo que o filósofo lida? Retornamos à estaca zero.
Em quarto lugar, o autor finaliza o texto afirmando que a filosofia não é determinada apenas pelo seu objeto de estudo, mas pelo método de estudo também, e que os principais métodos são o empirista e o racionalista (a priori, segundo consta no texo), métodos mutuamente incompatíveis. Mas se o método de trabalho do filósofo também define o que é a filosofia e se existem dois métodos incompatíveis, sem nada em comum, logo existem duas filosofias, uma para cada método, e assim precisamos de duas definições. Ou esses métodos têm algo em comum, coisa que o texto não abordou, mas que seria a chave para a definição da filosofia.
Considerando tudo isso, percebe-se que o texto não apresenta claramente a resposta para a pergunta "o que é a filosofia?" e que portanto, não cumpre ao que se propõe. Talvez isso seja uma reflexo da própria filosofia que ainda não tem uma resposta clara, rigorosa e não-contraditória para si, ou talvez o problema tenha sido outro.
Obrigado pela atenção.
R. Júnior: obrigado pelo seu comentário. Embora eu ache que ele tenha sido muito pouco caridoso, com afirmações peremptórias falsas que poderia ter sido evitadas com pedidos de esclarecimento e tenha partido de um mal-entendido sobre a natureza do meu texto, vou tentar responder da melhor forma.
ResponderExcluirMas é claro que não há a incoerência que descreves. Ela nem é uma incoerência. Porque o título é uma pergunta, disso não se segue que o texto contenha uma resposta. O texto vai *tratar* da pergunta e é isso que o texto faz. Um dos principais problemas com o tratamento das perguntas filosóficas é que em boa parte dos casos, principalmente entre jovens estudantes, eles procuram respondê-la antes mesmo de ter o seu conteúdo claro. E é claro que numa situação tal, a chance de fracasso é muito grande. E isso vale para qualquer pergunta, seja filosófica ou não. Dai a necessidade de se esclarecer o que a pergunta pede. Saber como responder a uma pergunta é um dos passos necessários para respondê-la corretamente. Eu acho estranho achar que estou sendo incoerente quando procuro justificar um modo de responder à pergunta. Eu deveria escolher esse modo arbitraria e dogmaticamente? Claro que não. Talvez digas o contrário porque não está acostumado com a atividade filosófica.
Eu nunca disse que a história da filosofia não é útil para a investigação que visa responder à pergunta "O que é filosofia?". O que eu disse é que este apelo não é útil: o apelo à simples opinião dos filósofos sobre o que é filosofia. Se tiveres paciência de ler uma outra postagem do meu blog, vai ver que acho a história da filosofia essencial para se fazer filosofia: http://problemasfilosoficos.blogspot.com.br/2008/06/histria-da-filosofia-exegese-e.html Seja como for, quem disse que manuais de e introduções à filosofia são livros de história da filosofia? O que eu disse é que a opinião dos filósofos *sobre o que é filosofia* não é suficiente para sabermos o que a filosofia é. Eu não disse que *nada* do que os filósofos dizem é importante pra a pergunta "O que é filosofia?". O que eles fazem, o seu filosofar, sim, é importante. E seu filosofar consiste em propor problemas e tentar lidar com eles. Ademais, trata-se de casos paradigmáticos de problemas filosóficos justamente porque os filósofos estão de acordo sobre se são casos de problemas filosóficos. Os casos em que há desacordo eu deixei de fora.
Os paradoxos filosóficos são aqueles que contém conceitos e intuições fundamentais. Ele podem surgir em várias regiões da nossa linguagem onde esses conceitos e intuições estão operantes. Sim, podem surgir na física (paradoxo de zenão, da viagem no tempo, etc.), na assistência social (embora não conheça nenhuma nessa área), na matemática (paradoxo dos conjuntos), etc. E se o físico tenta resolver esse paradoxo, então ele está fazendo filosofia. Não é necessário ser formado em filosofia para ser filósofo. É necessário fazer filosofia (que nem todo formado faz).
Sim, há mais de um modo de se fazer filosofia, e sobre isso não há consenso entre os filósofos. É por isso que se costuma dizer que a filosofia não é uma ciência, embora se possa fazer filosofia com método.
Em nenhum momento eu disse que iria responder à pergunta. O que o texto visa é dar os primeiros passos na busca de uma resposta. É uma investigação complexa e alguns resultados podem ser obtidos, algumas subperguntas respondidas, embora outras talvez tenham de aguardar mais para serem respondidas. E nisso a filosofia difere da ciência apenas em grau. Um físico responde a muitas perguntas, mas outras tantas ficam para trás e outras muitas surgem.
http://pt.scribd.com/doc/80588829/FISICA-PARA-FILOSOFOS
ResponderExcluirPágina 7.
Filosofia é um complexo que engloba...
Smesher: Obrigado pela dica, embora tenha achado o texto pouco claro e contra-intuitivo em alguns trechos. A filosofia diz como se deve fazer ciência? E como o filósofo sabe como fazer ciência se não é examinando como os cientistas fazem ciência?
ResponderExcluirSei que os nórdicos iam a caça e conservavam a carne colocando entre o lombo do cavalo e as cela, de forma que o animal corria as longas extensões, suava e salgava a carne.
ResponderExcluirEu nunca vi um nórdico, nem vi o lombo de um cavalo suar, mas posso saber como algo funciona sem ver.
Sei que um relógio pode funcionar através da captação de um decaimento radioativo leve(ou pesado, mas no caso seria cancerígeno). Mas nunca vi um decaimento radioativo. Nem ninguém nunca viu. Ninguém nunca viu também um átomo por exemplo, mas todos indícios nos levam a crer que existe. Mas estou estrapolando aqui. O ponto é que não é necessário ver algo sendo feito para saber como funciona. Caso contrário ninguém poderia entender os pensamentos de um filósofo sem ver pessoalmente ele produzindo sua filosofia. O que é algo absurdo de se dizer obviamente.
Creio que um filósofo pode compreender as ciências empíricas através do estudo da epistemologia, que estuda o conhecimento, classificando se é valido ou não e se é verdadeiro ou não. Epistemologia poderia até ser considerada o estudo da filosofia que aprova ou não os estudos de todas demais ciências. Assim um filósofo pode saber mais de ciência que o próprio cientista.
Ora eu também achei um tanto pouco claro e contra intuitivo em alguns trechos, mas creio que seja porque não era o objetivo do autor dissertar longamente sobre esse tema específico, ele dá explicações minuciosas quando se pergunta para ele no formspring. Se o senhor quiser eu mando o link do formspring dele.
Smesher: Falsa analogia. A filosofia e a ciência não são objetos teóricos, como os objetos postulados pela física. Mesmo assim você sabe como esses objetos teóricos se comportam porque físicos estudaram os fenômenos físicos e criaram teorias para explicá-los e prevê-los e vc sabe disso por meio de livros (ou programas de TV). Você não produziu esse conhecimento. Mas se estamos investigando o que é a ciência é como filósofos, estamos querendo obter esse conhecimento de primeira mão, queremos produzir esse conhecimento. E para isso temos que examinar aquilo que queremos saber o que é. Não podemos descobrir o que é a ciência salvo examinando a ciência, ou seja, o trabalho dos cientistas. De outra forma, como podemos saber que o que dizemos sobre a ciência é verdade?
ResponderExcluirE o que é a verdade?
ResponderExcluirNós não podemos dizer que tudo que sabemos sobre ciência é verdade, simplesmente porque chegaremos ao ponto em que mesmo o cientista não saberá mais explicar.
Por que existem doenças autoimunes? Como elas funcionam?
Não há quem saiba com precisão, pois as ciências são empíricas e são necessários testes que validem as descobertas e mesmo objetos de testes para os estudos. Há teorias científicas que são impossíveis de ser testadas empiricamente devido a nossas limitações tecnológicas. Existem doenças autoimunes com menos de uma dúzia de ocorrências na história, tive um professor com uma dessas e ninguém faz ideia de como ela funciona. E mesmo que houvesse muitos casos não é preciso simplesmente que os resultados dos testes sejam positivos ou negativos, é preciso que os testes sejam realizados de forma que tenham ligação lógica com os preceitos. É preciso que a conclusão do teste seja válida, suficiente para afirmar que o conhecimento produzido é “verdadeiro”.
Cientistas não tem necessariamente todo conhecimento sobre o procedimento de como se faz ciência. Eles sabem executar experimentos, mas não são eles que validam tais conhecimentos, tal trabalho é destinado a epistemologistas, isto é, filósofos. Um epistemologista não tem, porém, um conhecimento filosófico separado da ciência avaliada. Ele deve conhecer o tema envolvido nos testes empíricos e mesmo o procedimento dos testes, deve possuir o conhecimento do cientista e mais ainda. Ele poderia ser chamado cientista, mas seria um título que restringiria sua área de atuação e não o contrário. Para isso um filósofo que trabalhe com epistemologia pode ou não possuir um conhecimento minucioso sobre todas as ciências, mas deve possuir no mínimo um conhecimento considerável sobre a que está sendo avaliada. Não estou dizendo que há por ai muitos centros científicos contratando filósofos como seus consultores, mas que isso seria mais adequado do que pesquisas científicas feitas de forma desleixada que são desmentidas em poucos meses, algo que infelizmente ocorre com frequência.
Smesher: Não vou entrar no mérito do que disse, pois acho que mesmo que o que você disse sobre a ciência fosse verdadeiro, é irrelevante para o ponto em questão. Apenas me diga: como você sabe que o que você diz sobre a ciência é verdade? Como eu posso verificar o que você diz sobre a ciência? Você sabe isso sem ter examinado a ciência, ou seja, o que os cientistas fazem? Então examinou o que? Você não examina o triatlo (uma atividade), ou seja, o que os atletas fazem quando o praticam, para saber se o que se diz sobre o triatlo é verdadeiro? Por que a ciência é diferente?
ResponderExcluirAcabei de ler a parte primeira, vou ler a segunda. Bem, comecei a fazer filosofia por um motivo errado, (não que eu não goste, sempre gostei, mas não sabia que gostava tanto de filosofia quanto os indício apontavam). Ainda estou cursando filosofia, logo, sequer posso me valer tecnicamente de me chamar de filósofo (li aquele seu texto, Alexandre, sobre alguém que não te considerava um filósofo, em razão desta coisa de achar que filósofo foi só quem entrou para a história e tal, concordo com suas pontuações), enfim, sequer sou filósofo!
ResponderExcluirMas sempre tive problemas em não responder as coisas (especialmente para mim - qualquer coisa em si precisa de um sentido, ainda que provisório), e no curso de filosofia, que agora estou pelo motivo certo, eu me vi neste problema: estou cursando uma "coisa" que se algum conhecido me perguntar o que é eu não sei responder! Porque eu não posso citar a história da filosofia para justificar o que é filosofia (até porque eu mal conheço a história da filosofia). E também não posso citar um "fragmento" ou ramo da filosofia, porque não faria sentido. Vi alguns Doutores em Filosofia falar que filosofia é ciência. Mas eu não posso falar que seja ciência, talvez aquele doutor que disse possa, eu não, pois não posso explicar a filosofia enquanto ciência. Não faço ideia de como explicar Metafísica como ciência e elaborar um trabalho científico para corroborar minha explicação.
Então fiquei nesta situação desagradável, porque não basta que eu repita o conceito de alguém, eu tenho que ser capaz de explicar a coisa (e concordar ou não com ela é secundário!). Conversei com meus professores, e o dilema só aumentava!
Então, depois de uma conversa com um professor, eu acabei conseguindo um ponto de apoio para a resposta, ou, uma que eu possa explicar, (o que significa que tive que ir para o lado simplista e óbvio) e ficou: (para mim, neste momento) que filosofia é um ramo do conhecimento humano que se ocupa de elementos do conhecimento humano com os quais as ciências humanas possuem dificuldade de lidar, por estes conhecimentos serem difíceis de serem atestados pelas ferramentas conhecidas pela ciência.
Agora vou ler o texto! Estou gostando muito dos seus textos Alexandre! É muito bom que se disponha a compartilhá-los!
Muito obrigado pelo seu comentário e elogios. Mas receio que tenho que discordar da tua definição de filosofia. Ela é muito restritiva. Há Ramos da filosofia em que o objeto de reflexão não é co conhecimento, tal como a ética, a filosofia política e a estética. Não que perguntas epistêmicas não sejam feitas nessas áreas. Elas são. Mas esse não é o ponto central dessas disciplinas.
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