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terça-feira, 10 de junho de 2008

Paradoxo de Frege ou Enigma de Frege?


Considere a seguinte apresentação do Paradoxo de Frege:
Here are some examples of identity statements:
117+136 = 253.
The morning star is identical to the evening star.
Mark Twain is Samuel Clemens.
Bill is Debbie's father.
Frege believed that these statements all have the form ‘a=b’, where ‘a’ and ‘b’ are either names or descriptions that denote individuals. He naturally assumed that a sentence of the form ‘a=b’ is true if and only if the object a just is (identical to) the object b. For example, the sentence ‘117+136 = 253’ is true if and only if the number 117+136 just is the number 253. And the statement ‘Mark Twain is Samuel Clemens’ is true if and only if the person Mark Twain just is the person Samuel Clemens.
But Frege noticed (1892) that this account of truth can't be all there is to the meaning of identity statements. The statement ‘a=a’ has a cognitive significance (or meaning) that must be different from the cognitive significance of ‘a=b’. We can learn that ‘Mark Twain=Mark Twain’ is true simply by inspecting it; but we can't learn the truth of ‘Mark Twain=Samuel Clemens’ simply by inspecting it — you have to examine the world to see whether the two persons are the same. Similarly, whereas you can learn that ‘117+136 = 117+136’ and ‘the morning star is identical to the morning star’ are true simply by inspection, you can't learn the truth of ‘117+136 = 253’ and ‘the morning star is identical to the evening star’ simply by inspection. In the latter cases, you have to do some arithmetical work or astronomical investigation to learn the truth of these identity claims. Now the problem becomes clear: the meaning of ‘a=a’ clearly differs from the meaning of ‘a=b’, but given the account of the truth described in the previous paragraph, these two identity statements appear to have the same meaning whenever they are true! For example, ‘Mark Twain=Mark Twain’ is true just in case: the person Mark Twain is identical with the person Mark Twain. And ‘Mark Twain=Samuel Clemens’ is true just in case: the person Mark Twain is identical with the person Samuel Clemens. But given that Mark Twain just is Samuel Clemens, these two cases are the same case, and that doesn't explain the difference in meaning between the two identity sentences. And something similar applies to all the other examples of identity statements having the forms ‘a=a’ and ‘a=b’.

So the puzzle Frege discovered is: how do we account for the difference in cognitive significance between ‘a=b’ and ‘a=a’ when they are true? [Edward W. Zalta. "Frege", Stanford Encyclopedia of Philosophy. Para uma apresentação mais concisa, mas semelhante em alguns aspectos que vou comentar a seguir, ver Wikipedia, "Paradoxo de Frege"]
Assim formulada, essa pergunta parece fácil de responder: no caso de uma frase da forma a=a, sabemos a priori que é verdadeira porque sabemos a priori que as duas ocorrências de "a" nos dois lados da igualdade são ocorrências do mesmo nome. Se são ocorrências do mesmo nome, então é porque nomeiam a mesma coisa. Mas não sabemos isso no caso de frases da forma a=b, pois "a" e "b", obviamente, não são o mesmo nome. Todavia, do ponto de vista epistêmico, tanto podem ser dois nomes da mesma coisa, quanto podem ser nomes de coisas diferentes.

Bem, de fato há situações em que podemos não saber se duas ocorrências de "João", por exemplo, são ocorrência do mesmo nome. Nesse caso, não sabemos se João é João. (Agradeço ao Rodrigo Jungmann de Castro por me chamar atenção para isso.) Creio que em tais casos deveríamos formalizar "João é João" assim a=b, pois se formalizássemos assim a=a e descobríssemos que João não é João, então a negação pareceria um contra-exemplo do princípio de identidade: ~a=a. Tais casos são casos em que não sabemos se as duas ocorrências de "João" são ocorrências do mesmo nome (no sentido explicado acima) e, por isso, não sabemos se a frase diz algo da forma a=b ou a=a.

Se, pois, sei que as duas ocorrências de "João" em "João é João" são duas ocorrências do mesmo nome, então sei a priori que o que essa frase diz (a saber, algo da forma a=a) é verdadeira.

O problema de Frege não é apresentado na passagem citada (e no verbete da Wikipedia citado acima) como um paradoxo, mas um enigma, uma pergunta difícil de responder. Um paradoxo é uma inferência aparentemente válida que parece ter premissas verdadeiras e conclusão falsa. Por isso, acho que, se queremos apresentar o problema como um paradoxo, deveríamos apresentá-lo como a seguinte inferência:
1. Se o que é suficiente para compreender uma frase qualquer é suficiente para que conheçamos o seu valor de verdade, então podemos conhecer o seu valor de verdade a priori.
2. Se sei o que duas expressões significam, sei se significam ou não a mesma coisa.
3. Para compreender uma frase da forma a=b, tenho que saber o que "a" significa e o que "b" significa.
4. Uma frase da forma a=b diz que o que "a" significa e o que "b" significa é a mesma coisa.
5. Portanto, podemos conhecer a priori o valor de verdade de qualquer frase da forma a=b.
Essas premissas, se devidamente interpretadas, são intuitivas. (Agradeço ao Giovani Felice por me chamar atenção para modos alternativos de se interpretar essas premissas.) Creio que 1 é suficientemente clara. Ela supõe que a compreensão é a priori, coisa que os externistas não aceitam. 2 se refere aos casos de tradução. Se sabemos o que "verdade" significa e o que "truth" significa, então sabemos se significam a mesma coisa ou não e, portanto, sabemos e podemos traduzir uma palavra pela outra. 3 enuncia uma condição para a compreensão de uma frase em que "a" e "b" estão sendo usados. Eu não compreendo as frases do sueco porque, entre outras coisas, não sei o que as palavras suecas significam. 4, finalmente, diz que a=b diz que o que é significado por "a" e "b" é a mesma coisa.

Mesmo que se admita que podemos conhecer a priori o valor de verdade de algumas frases da forma a=b, é certamente falso que podemos conhecer a priori o valor de verdade de todas as frases dessa forma.

Acho que a apresentação do problema de Frege na forma de um paradoxo tem a vantagem de apresentar a busca de uma solução para o problema como algo mais urgente. Ela é mais puzzling que a sua forma enigmática.

A solução de Frege para esse paradoxo (em "Sobre Sentido e Referência") seria mostrar que essa inferência é uma falácia de equivocação, onde a expressão "o que x significa" está sendo usada de maneira ambígua, ora com o sentido de "sentido" (em 2 e 3), ora com o sentido de "referência" (em 4).

Embora tenha feito, na Begriffsschirift, uma análise meta-lingüística das frases que expressam identidade, tal como parece o caso na premissa 4, Frege mais tarde criticou essa análise, entre outras coisas porque implica uma ambiguidade sistemática dos nomes, dado que em fases predicativas singulares, o nome não parece ser usado meta-lingüisticamente, mas principalmente porque o fato de "a" e "b" se referirem ao mesmo objeto é contingente e as relações de identidade e diferença são necessárias. Todavia, a expressão "o que 'a' significa" não parece estar se referindo à expressão "a", mas àquilo a que essa expressão se refere, a saber, a. A premissa 4, portanto, não parece dizer o mesmo que
Uma frase da forma a=b diz que "a" e "b" significam a mesma coisa.

(Agradeço a Rodrigo Jungmann de Castro, Giovani Felice e Marcio Larrusscahim por discussões críticas sobre esse tópico. Revisado em 13/06/08)

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