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quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Consideração pela opinião alheia

Uma vez um aluno me fez a seguinte crítica: "O senhor não leva em consideração a opinião da gente!". Eu então disse: "Claro que levo. Sempre analiso com cuidado o que vocês dizem. Até ajudo vocês a formularem suas opiniões." Ele então disse: "Mas o senhor sempre tem um argumento contra o que a gente diz!"

Essa reação mostra dois problemas. Um deles é a cegueira para o acordo. É claro que em grande parte dos casos eu concordo com as opiniões dos alunos. Mas aqui ocorre algo análogo à percepção comum da competência dos meteorologistas: apenas os seus erros são notados. Os acertos não viram assunto de conversa.

O outro problema, mais grave, é a visão negativa da crítica. Ela é vista como uma demonstração de falta de respeito, de falta de polidez, mesmo quando é feita da maneira o mais objetiva e gentil possível. Eu creio que isso se deve a um aspecto negativo da nossa cultura: uma visão distorcida da cordialidade, que vê a franqueza e a crítica como falta de cordialidade. Essa visão tem efeitos desastrosos principalmente no âmbito acadêmico, tornando o que poderia ser uma discussão frutífera numa "conversa de comadres".

Todos que me conhecem sabem do meu apreço pela discussão crítica, pelo embate de argumentos. Eu acho que ganho muito com ela. Mas acho que todos podem ganhar com ela, se não a encararem como uma coisa negativa. Meu apreço pela discussão crítica é tal que eu creio que a melhor forma de texto filosófico é o diálogo.

É claro que certas pessoas usam essa visão positiva da franqueza e da crítica para tentar justificar grosserias durante uma discussão. Grosserias, entretanto, simplesmente não se justificam. Todavia, ser franco e crítico não é ser grosseiro ou desrespeitoso.

Apresentar argumentos contra a opinião de alguém não é sinal de falta de respeito ou de consideração. Eu me sinto homenageado quando alguém vem no meu blog e escreve uma crítica respeitosa, mostrando as razões de por que discorda de mim. Um amigo meu, antes de dar uma palestra, às vezes diz: "Estou aqui para receber críticas. Para elogiar o que eu faço, já tenho a minha mãe." O espírito é esse! A crítica nos ajuda a ver onde podemos melhorar nosso trabalho. Reclamar que a pessoa tem argumentos contra o que pensamos é como reclamar que ela está sendo racional! É como se quiséssemos não ser informados de que estamos errando, se esse for o caso.

6 comentários:

  1. Sou professor e concordo plenamente com esta posição infelizmente vivemos numa sociedade em que tenho dito que se precisa reconstruir conceitos para que sejam corrigidas falhas como estas de entenderem as criticas como algo desrespeitoso ou falta de consideração pelo contrario quando fazemos uma critica queremos contribuir com a discussão abrindo espaço para o dialogo argumentativo o que poderá resultar numa grande chave para a produção de conhecimentos

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  2. Já li outro tipo de confusão em debates escritos, especialmente politicos. A confusão do dever do respeito à pessoa e sua liberdade de expressão/crença, do falso dever do respeito à opinião. Por respeito a opinião entendia-se o "direito" do cidadao falar qualquer bobagem sem ser refutado ou criticado, vendo-se isto como uma espécie de censura. Como se critica fosse igual a censura.

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  3. Só surge a verdade entre debatedores sinceros.

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  4. A sinceridade não é uma condição necessária para a verdade. Mas é mais provável que pessoas engajadas na busca pela verdade e sinceras a encontrem.

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  5. Necessariamente a verdade surge da sinceridade (seja lá de que forma for). Debatedores hipócritas nunca a encontrarão.

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    1. Claro que não! Um mentiroso pode muito bem descobrir a verdade.

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