A crença religiosa poderia apenas ser algo como um comprometimento apaixonado a um sistema de referência,... um modo de viver...Meus amigos ultimamente têm discutido muito sobre filosofia da religião. Afetado por isso, eu comecei revirar meus pensamentos sobre o assunto e a lembrar das coisas que tinha lido e que me marcaram. Ou seja, fui usar o intelecto para abordar o tema... Mas então eu lembrei de algo que li e que me tocou o coração. É a passagem acima. Nunca entendi a religião como algo desligado de um certo chamado para mudar radicalmente minha forma de viver. O que eu sentia era que, se Deus existisse, ele me chamaria para viver uma nova vida, melhor. Por isso, sempre que eu olhava para o mundo ou para mim mesmo na esperança de vê-lo, o que eu procurava era por esse chamado. E o mais próximo que estive do que se poderia chamar de experiência mística foi naqueles momentos em que eu achava que podia ouvir esse chamado, bem fraco, cheio de ruído, lá no fundo de não sei o que... Foram momentos em que a vida parecia estar me dando alguns sinais. Nesses momentos eu cheguei a ver um pouco da minha vida transformada... Eu simplesmente não entendo que uma experiência mística seja uma experiência mística sem que esteja relacionada a esse tipo de chamado, de vocação; sem que esteja ligada à nossa forma de viver. Por isso, não entendo as pessoas que se dizem religiosas, que dizem ter tido experiências místicas, mas nunca sentiram a necessidade de mudar radicalmente seu modo de viver. Mas tampouco consigo entender monges. A vida monástica sempre me pareceu um erro colossal. Adotá-la nunca me pareceu uma mudança radical no modo de viver, mas um retirar-se da vida. É por isso que o que estou dizendo não é uma interpretação de Wittgenstein.-- Wittgenstein (Cultura e Valor)
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quinta-feira, 29 de maio de 2008
Wittgenstein e a religião
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Alexandre, nao consegui entender o que voce quer dizer com a necessidade das pessoas serem religiosas e em determinado ponto da vida, da opcao por determinada religiao ela precisar "mudar radicalmente seu modo de viver"
ResponderExcluirRenato: Eu não disse que há necessidade de as pessoas serem religiosas. Por outro lado, se uma pessoa for santa e seu modo de viver não precisa ser melhorado, então ela não vai sentir a necessidade de mudar radicalmente sua forma de viver. E estou entendendo "santo" aqui num sentido muito diferente daquele que os católicos usam, onde basta ter defendido os dogmas religiosos e ter intervindo para a ocorrência de milagres para alguém ser santo.
ResponderExcluirOi Alexandre
ResponderExcluirSuspeito que muitas pessoas concordariam contigo. Eu concordo, pelo menos até onde consegui entendê-lo! (Talvez eu pudesse discordar do título da tua postagem, e sugerisse o seguinte: "AM e a religião".) Não me pareceu que estivesse descartando a possibilidade de uma mudança radical em um modo de vida, uma mudança para melhor, uma verdadeira transformação, sem que a essa mudança esteja associada uma experiência mística, em todo caso, sem que assim seja sentida e concebida por alguém que assim se transformou. É isso? Por outro lado, também não me pareceu que estivesse descartando a possibilidade de se distinguir experiências místicas, digamos, "genuínas", de meras "ilusões" de experiências místicas (que não se trate de charlatanice,deixemos de lado os verdadeiros charlatões). É isso?
Um grande abraço
Giovani: em boa parte das vezes é muito prazeroso que as pessoas concordem com a gente. Algumas vezes gostaríamos de estar errados e que as pessoas nos mostrassem isso... Mas o prazer de ser entendido não tem uma contrapartida negativa como essa. -- Entendeste perfeitamente o que eu disse, embora para mim seja difícil falar claramente sobre esse tema. Eu acrescentaria apenas que assim como pode-se ter a ilusão de ter tido uma genuína experiência mística, pode-se tê-la sem que seja pensada como tal, simplesmente porque não se está de posse do conceito de experiência mística, vago do jeito que é. Grande abraço.
ResponderExcluirMuito bom, Alexandre.....Tudo bem, isso não é lá um comentário de filósofo, mas, até onde lembro, essas são as tuas palavras mais sensíveis e uma indicação de que tua bela alma anda querendo se mostrar.
ResponderExcluirFlávio: Obrigado! Abraço.
ResponderExcluirMuito bacana seu ponto de vista professor. Parece se aproximar do que os católicos chamam de mística da inserção no mundo, só que laica. É uma 'abordagem' que se encontra também em algumas correntes da mística judaica e no budismo zen. Achei curioso o fato de vc não ter 'empatia' com os que escolhem a vida monástica ou sua radicalização nos eremitérios: a visão que vc dá me parece exatamente o 'duplo' do ascetismo -um é uma diástole e o outro uma sístole (perdoe a metáfora, mas foi a que me ocorreu agora).
ResponderExcluirSaudações
Calazans: Obrigado pelo comentário. Minha falta de empatia pela vida monástica se deve ao que eu disse: "Adotá-la nunca me pareceu uma mudança radical no modo de viver, mas um retirar-se da vida."
ResponderExcluirA experiência de Deus é algo EXTREMAMENTE simples - algo que está aquém da simplicidade intramundana. É uma experiência que se dá "fora do tempo", mas apenas no sentido em que o tempo é "tema" dessa experiência. O tempo é visto, nessa experiência, como "parte da criação". A vida toda, e o tempo que lhe dá uma espécie de "matéria" imutável, aparece nesses momentos como um milagre. É esse o pano de fundo de toda experiência religiosa autêntica (que não se confunde com medo da morte ou desejo de legislar sobre o futuro). Não são muitas pessoas que têm essa experiência. A atitude mais comum é a do "Judeu Errante": você vê o rosto de Deus, e segue como se nada tivesse acontecido. As que conseguem enxergar o mistério incorporam essa visão de diferentes modos à sua existência. Alguns viram "monges", e colocam essa experiência no centro da existência (que é onde ela, no final das contas, deveria mesmo estar). Outras vivem o momento como um instante fugaz de iluminação. A vida destas últimas é indistinguível da vida de qualquer outra pessoa.
ResponderExcluirEu tendo a concordar com tudo que dizes, João. Mas ainda penso que a vida monástica é uma fuga.
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